O Estado do Rio de Janeiro sempre foi o alvo preferencial das intervenções autoritárias. Lembre-se do golpe de 64, no qual os tanques vieram de Minas Gerais para reprimir a resistência. A própria fusão GB/RJ foi manobra política para submeter a antiga Guanabara aos barões do antigo RJ. Portanto, a experiência de manobras dos políticos burgueses no Estado é vasta. Basta como exemplo a chapa Aezão na qual Pezão elegeu-se no jogo duplo que depois ficou demonstrado no episódio do impeachment. Declarou-se contra, juntamente com Dornelles do PP, no entanto a bancada na Câmara contou apenas com dois votos contrários, do filho do Presidente da ALERJ, Picciani, e do pau mandado de Cunha, um ex-diretor da UNE no breve período que a esquerda a dirigiu com o discurso pela não assinatura da Constituição.
A tutela do judiciário e o verticalismo político da Constituição de 88
A constituição brasileira de 88, que adotou Estado Democrático de Direito, foi elaborada sob os mesmos critérios divergentes entre o número de votantes e de deputados, no qual o Estado do Rio e os outros mais populosos ficaram com uma representação desproporcional à sua população. Ou seja, o mesmo congresso da ditadura, acrescido apenas da virtual liberdade de organização partidária. De um modo geral, a Constituição formalizou o velho dogma de que as normas se sobrepõem aos princípios e além disso consagrou a tutela judiciária. Hoje esse é o principal elemento que sufoca qualquer permeabilidade das demandas dos trabalhadores de baixos salários quer trabalhem no setor público como ou privado. Isso já é antigo, mas ficou mais visível quando foi nomeado, pelo governo do estado, um presidente do TJ-RJ que elaborou a doutrina da responsabilidade civil contra empresas de transporte que não oferecessem segurança aos usuários. Ao assumir, mudou de posição, e hoje se vê àquilo que as manifestações de 2013 denunciavam: o esquema político se mantém tendo como base a promiscuidade entre empresas de transporte, com suas altas tarifas, o executivo e o judiciário. O então deputado constituinte do PT, Genoíno, teve uma antevisão de que essa aliança legislativa e do executivo tuteladas pelo judiciário apenas confirmariam o verticalismo e a exclusão participativa popular, por isso propôs que o PT não assinasse a Constituição de 88. No entanto, o PT ameaçou-o de expulsão, já que Genoíno fazia parte de uma tendência radical que liderava o movimento estudantil na época, o PRC. Por fim essa tendência se dissolveu e Genoíno capitulando foi dar a maioria para que o PT fosse tomado pelos ainda mais “radicais” frente-populistas que amarraram o PT à burguesia.
O papel da Igreja católica na ofensiva pentecostal e da direita
E isso já ocorreu na eleição de 89, aceitando acordos espúrios com partidos burgueses. A aliança do PT com a burguesia incluía o atual articulador do massacre social e político no Rio de Janeiro, o blindado Moreira Franco. Assim, como se viu posteriormente nos escandalosos financiamentos de campanha, na verdade sempre houve jogo duplo. E o PMDB de Moreira e o PSDB, filhote da Aliança Liberal, esperavam a oportunidade para o bote. O PT, aderindo assim finalmente à linha da Igreja Católica que tentava adequar o movimento pela reforma agrária à Aliança do PMDB com os escolhos da ditadura, a famigerada chapa Tancredo/Sarney. Com isso a Teologia da Libertação foi praticamente expulsa e a luta pela reforma agrária foi conduzida para o calvário da assembleia constituinte. E hoje a Igreja se cala diante da invasão pela PM da Igreja São José para balear manifestantes. Como aliás já havia se calado na visita do Papa, quando agentes provocadores da polícia foram filmados dentro das manifestações contra a Copa em frente ao Palácio Guanabara reformado com uma verba milionária para o evento. Na Constituição, a Igreja que pouco tinha participado do movimento pelas Diretas Já, acabou sendo agraciada pela imposição o nome de “Deus” no seu preâmbulo. Essa imposição foi como uma das tantas emboscadas da UDR de Ronaldo Caiado que ceifou a vida de inúmeros trabalhadores rurais e lideranças sindicais ligadas à própria Igreja, mas que naquele momento eram repudiadas pelo “Santo” Papa João Paulo II, que já era bastante experiente em restauração capitalista no seu país natal. Desde então se notou o vertiginoso crescimento das igrejas pentecostais de clara orientação direitista.
A tradição verticalista e pró-capitalista do aparato político e legal
A Constituição também manteve intacto o oligopólio da mídia que se fez sentir na primeira eleição presidencial em 89. Aliás, a burguesia brasileira nunca esteve muito contente de aceitar eleições diretas. Assim, impulsionou para sabotá-la um candidato sem base social e parlamentar para depois derrubá-lo. Adicionou às suas Disposições Transitórias, um plebiscito sobre o parlamentarismo e – pasme – um outro plebiscito pela monarquia e em ambos os itens foi fragorosamente derrota. Porém a tática da experiente burguesia brasileira se fez sentir na manobra pelo parlamentarismo informal com FHC, que faria sua intervenção em favor dos bancos que o catapultaria a presidência por duas vezes consecutivas.
Os objetivos dos arranjos de poder
A estratégia de FHC foi tão bem sucedida que foi repetida agora no destronamento do governo Dilma. Por conta disso, o Plano de Ajuste Fiscal segue linhas muito semelhantes, já que o controle monetário e cambial já havia sido feito no próprio governo da FBP pelo atual ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, que foi presidente do Banco Central nos dois mandatos de Lula, e que preparou a sua plataforma de governo: a carta ao FMI. Dinheiro não faltaria e dez por cento (a gorjeta) disso seria destinado aos programas sociais.
A guerra militar e policial contra as comunidades e os manifestantes
Posteriormente, todo o esquema repressivo montado na Copa e das Olimpíadas articulara o fator decisivo para a instalação desse governo intervencionista, usurpador e privativista que ora agride a classe trabalhadora. A lei antiterrorismo, precedida pela UPP, confinou as comunidades, favoreceu a expansão do tráfico de drogas em âmbito nacional e criou uma situação de caos na segurança pública proposital para favorecer uma intervenção militar. O governo do Estado blindado pelo Judiciário, cujos desembargadores indicados são aliados, fechando os olhos ao esquema repressivo montado contra manifestantes e a guerra civil controlada pela PM com expedições punitivas nas comunidades, como a chacina do Chapadão, se sucedem. Trabalhadores, ativistas, estudantes e até dirigentes sindicais têm sido detidos de modo provocativo dentro das manifestações e alguns têm sido libertados pela pronta defesa dos próprios ativistas. Desse modo a PM têm reiteradamente feito o seu show de arrogância em horário programado com as redes de TV para mostrar a sua capacidade de truculência que habitualmente usa nas comunidades.
A guerra social contra os trabalhadores e servidores
A guerra social também se ampliou com todo o cinismo, em muitos casos, não retiram o direito do papel, mas o retiram em forma de gradual extinção dos serviços públicos. Nisso há que se dizer que a resistência não tem sido audaciosa.
A colaboração de classes eleitora e militar e a sabotagem dos movimentos classistas
Um dos motivos é a confiança que muitos setores do movimento colocam nas respostas parlamentares e as alianças com setores que visivelmente sabotam o movimento. Ao terem se submetido à política dos partidos burgueses que tomaram o controle de vários sindicatos, como exemplo os coxinhas do MUSPE que servem como fachada para lideranças ligadas aos deputados de orientação fascista. A autoproclamada esquerda, que já hegemonizou vários sindicatos, também está em crise, e foi deposta de vários sindicatos por conta de seus inúmeros erros, e apoiar greves policias foi um dos mais graves, acredita ainda numa aliança com esses setores tendo em vista que não têm projeto de superar essa corja pela auto-organização dos trabalhadores, mas sim acumular forças para um novo processo democrático-popular onde sonham superar a combalida FBP.
A cruz encontra a espada
E isso é tanto mais sonhador, na medida que hoje estamos numa situação onde a cruz encontrou a espada. Ou seja, igrejas cada vez mais hostis e organizadas juntas com milícias que por sua vez são aliadas aos traficantes de armas e drogas. Tudo isso camuflado pela “ineficiência” e “vantagens” recebidas pela “segurança pública”, cuja ação é protegida pelo judiciário antioperário e racista. Todo esse cenário demonstra tratar-se de um Estado já submetido ao poder das corporações, por empreiteiras, empresas de transporte e todo o conjunto de transnacionais envolvidas na privatização, financiada pelo BNDES, das águas e do pré-sal.
Por um programa operário classista para o movimento de luta independente
Está na hora dos movimentos experimentarem uma estratégia diferente da que teve até agora: ao invés da caduca estratégia democrático-popular uma nova estratégia de organização da luta operária classista. Sintomas da possibilidade dessa nova estratégia já começam a aparecer com o fracasso dos partidos eleitorais e da traição da greve geral que colocou mais desconfiança nas burocracias sindicais. Uma virtual substituição já se apresenta, nas eleições do Sindipetro e se forma também uma oposição à diretoria da Força Sindical no Sindimetal de Volta Redonda. Entretanto, se não se modificarem os métodos e os programas das novas direções, se imitarem o mesmo trajeto do PT e da CUT, limitando os movimentos apenas aos processos eleitorais, burgueses e sindicais, não haverá avanço. É preciso organizar toda a classe para além mesmo das organizações tradicionais, impulsionar a horizontalidade e a decisão coletiva de novos organismos de luta, nos locais de trabalho e comunidades. Principalmente, num momento que é preciso não ser pego de surpresa pelas ofensivas armadas e militares da burguesia. Vacilar nesse chamado apenas beneficiará as frentes sem princípios classistas que tantas derrotas nos têm trazido.